quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

Ódio via satélite

Você mora em uma casa. Há cozinha, quarto, sala e banheiro. Um belo dia chega um pessoal dizendo que aquela casa pertence a ele. Pelo fato de serem mais fortes, estas pessoas criam algumas regras: durante o dia, vocês podem utilizar a sala e a cozinha, desde que devidamente autorizados. A partir das 18 horas, ninguém da sua família pode sair da sala, até o dia seguinte, às 6 horas. O quarto vocês nunca mais poderão vê-lo, já que a entrada é terminantemente proibida.

Este é basicamente o enredo de um filme saudita chamado Violação de Domicílio, cujo objetivo é retratar o drama vivido por palestinos nos territórios ocupados.

Cinema à parte, a situação na Faixa de Gaza, principalmente, não tem nada de ficcional. Há pouco mais de uma semana, pessoas inocentes – sem distinção de mulheres, crianças, homens ou velhos – eram bombardeadas diariamente pelas forças israelenses. A alegação é que pertenciam ao Hamas, o famoso grupo extremista que não aceita o estado de Israel.

Independente de o Hamas estar certo ou errado, a maioria do milhão e meio de pessoas que vive naquele local não fazem parte do grupo, ainda que compartilhem certo ódio pelos judeus. No entanto, nada justifica o que foi feito nesta última ofensiva, que não tem absolutamente nada de guerra, e sim uma agressão covarde de um Estado contra pessoas indefesas – o povo é sim indefeso, tanto que combate soldados com pedras.

A ação é lamentável e não é resposta a nada. É sim mais uma prova da influência dos EUA naquela região, patrocinando os israelenses, como se o ocidente ou o mundo todo tivesse algum tipo de dívida com eles por conta do holocausto.

Era final de ano no Brasil, mais precisamente na interiorana Mogi das Cruzes. Era 27 de dezembro de 2008 e as pessoas se preparavam para o Reveillon. As tevês noticiavam a superlotação das praias, as simpatias para começar 2009 com o pé direito. Alguns ainda aproveitavam a passagem do Natal e mostravam dicas de como trocar os presentes ganhados.

Na televisão, a primeira notícia mostrava o bombardeio de Israel à Faixa de Gaza. “Que absurdo. Essa coisa de fanatismo religioso é uma loucura”, dizia a humilde aposentada à irmã. Juntas, elas esperavam pelo início da novela, mas as reportagens da ofensiva israelenses chamaram a atenção.

Mártires orando, civis mortos, destruição em massa. Era impossível aos olhos dos brasileiros entender o que se passava do outro lado do mundo. Talvez seja impossível até hoje, por mais que alguns jornalistas tenham sido enviados especialmente para lá para tentar compreender as questões palestinas.

Suscitaram-se, a partir daí, uma série de hipóteses na mídia brasileira. “Se Israel queria acabar com os extremistas, não conseguiu. Apenas fortaleceu o Hamas”, dizia a Folha de S. Paulo. Outros comentários davam conta de que os ataques israelenses representavam nada mais do que o genocídio puro.

Mas a verdade é que seria muito leviano tecer algum comentário sobre a discórdia que envolve palestinos e israelenses, dado que não temos idéia do que se passa por lá. Relatar as mortes ou fotografar desgraças não reflete a essência real do problema, que é social, histórico, religioso, racial, entre outros pontos que são invisíveis a olho nu.

Leia Mais…
terça-feira, 20 de janeiro de 2009

God bless America!!!





Rosa Parks sat so Martin Luther King could walk.

Martin Luther King walked so Obama could run.

Obama ran so we can all fly”.

Parecia um poema, mas era na realidade a manchete do “Newsday”, de Long Island (NY), no dia 19 de Janeiro. Por trás do tom de versinho, uma realidade romântica incorporada pelos eleitores norte-americanos: Barack Hussein Obama é o percussor de Luther King. Significa a esperança de novos tempos para uma sociedade descrente.

Talvez a figura de Obama esteja sendo muito mais exaltada pela mídia do que pelo próprio povo, mas o fato é que os norte-americanos depositam nele todos os clamores e expectativas de progresso, honestidade e benevolência.

O senador democrata virou, repentinamente, o salvador do mundo. Se falta comida, Obama salva. Se falta dinheiro, Obama salva. Se sobram mortes e guerras civis, Obama salva também.

Analisando de fora, uma série de clichês acompanham o novo presidente e podem justificar o porquê ele parece ser o último dos heróis. Primeiro, porque representa a garra dos negros, historicamente repreendidos e sedentos por justiça. Depois, porque trouxe consigo a promessa de “mudança” para aqueles que repudiam o atual governo Bush.

Por isso, são muitos os fatores históricos, sociais e políticos que conspiram a favor de Obama. Também são inúmeros os cidadãos estadunidenses que depositam nele uma fé quase que religiosa, a ponto de idolatrá-lo e venerá-lo sem sequer saber do seu passado político ou das promessas futuras.

O fato é que Obama começa seu mandato preso aos anseios do mundo. Será o foco das atenções mundiais e qualquer vacilo banal pode repercutir imensamente.

Se tudo correr bem – e se correr mal também -, uma importante página da história será escrita hoje quando Barack Obama for empossado presidente dos Estados Unidos.

Até aqui, o maior mérito do ex-senador foi ter despertado um interesse fora do normal por política nos jovens, daquele e de outros países espalhados pelo mundo.O apelo pop do novo presidente é indiscutível, e Obama, com certeza, figura fácil na parede ao lado de ídolos da música ou do cinema em quartos adolescentes planeta afora.

O fato de ele ser negro não deveria ser motivo para tanta euforia – aliás, nem mesmo para esta linha que você acabou de ler. Diariamente fico me perguntando se relembrar a cor da pele dia sim dia também não é racismo. No discurso do politicamente correto, ser o primeiro presidente de um país reconhecidamente racista não deveria significar nada, apesar de que eu acho um puta avanço por lá.

Outra coisa que incomoda é o tratamento de novo “Jesus Cristo” dado a Obama. O cara estará à frente da mais poderosa - ou seria imperialista – nação do mundo, mas não tem uma vara de condão para fazer sumir ou aparecer coisas. Crises econômicas, conflitos no Oriente Médio, guerras civil na África e os países em desenvolvimento pedindo migalhas são apenas alguns dos desafios.

Muita coisa pode mudar, mas é melhor esperar o andar da carruagem para ver o que, de fato, ira melhorar na vida de cada um dos habitantes do planeta.

Mas, a melhor notícia disso tudo é o Bush fora. Ufa!

Leia Mais…
quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

Muito além de um filme

Esqueça o não-cenário de Manderlay (idêntico ao de Dogville). Este não é o detalhe que vale a pena no filme de Lars von Trier. O que faz a diferença no longa é exatamente o princípio que permeia o Baião de Dois: ponto de vista diferente. Apesar de a crítica pegar no pé do diretor dinamarquês abordar um assunto tão “estadunidense”, a escravidão, poucas pessoas conseguiram contar a história como ele. Pelo menos das coisas que já vi/li/ouvi, nada se compara.

Invertendo completamente a lógica da coisa, Lars Von Trier consegue causar um verdadeiro malestar (novas regras ortográficas) em quem assisti ao filme. Cria-se uma sensação física mesmo, de ansiedade em relação às próximas cenas. Violência Gratuita, de Michael Haneke, também me deixou com uma sensação parecida.

Além do conhecimento histórico trazido à baila, o grande mérito do diretor é demonstrar como uma inversão de papéis e um olhar de um lado diferente ao comum podem mudar o entendimento sobre um assunto que a maioria das pessoas tem uma opinião muito bem definida e alinhada entre si.

O exemplo deveria servir para qualquer um que queira contar uma história, sobretudo, se se tratar de oprimidos versus opressores. Mesmo se não quiser contar absolutamente nada, a forma como foi filmado, faz com que pensemos sobre nossas convicções e os famosos “certo e errado”, além da questão daquilo que significa justiça e injustiça.

É um filme, mas Manderlay funciona como uma aula de filosofia com requintes de análises psicológicas.






Existem filmes bons ou ruins. Alegres ou tristes. Fictícios ou reais. E existe Manderlay.

O segundo capítulo da trilogia de Lars von Trier é capaz de reunir todos esses paradoxos em um longa de uma riqueza tão infinita de interpretações que é difícil encontrar uma só palavra para descrevê-lo.

Primeiro, pelo fato de que, assim como em Dogville e provavelmente na terceira etapa da série que ainda está por vir, o cenário é desprovido de complementos cinematográficos. Os espaços são delimitados por paredes imaginárias e demarcações no solo, o que causa estranheza à primeira vista e requer do espectador uma atenção minuciosa.

Depois, pela história narrada. Não revelarei o enredo, mas a personagem de Grace mais uma vez oscila entre glórias e infortúnios em questão de minutos, o que eu considero ser a parte mais sensacional do filme. Como, em quase três horas de filme, toda a conjectura construída é arruinada, de uma maneira tão exata e certeira. E como tudo isso gera no espectador uma série de reflexões e sensações ao mesmo tempo. O filme te obriga a pensar desde o início, já que trata da questão de negros escravos e te cerca de personagens que resgatam aqueles preceitos da escravatura estudados nas aulas de história que você jamais lembraria.

Posto isso, o diretor quebra toda a estrutura ao final do filme. Quando você já havia raciocinado exaustivamente sobre cada cena. Daí a ruptura é tão brusca que a única conclusão que eu chego é que Lars Von Trier propõe um filme tão maçante e longo justamente para rechear sua mente de idéias e, de repente, quebrar todas elas de uma só vez. A peculiaridade é que não é um desfecho patético, só para impressionar. Tudo faz sentido, e muito.

Leia Mais…